sexta-feira, 28 de agosto de 2015

INTERIORIDADE





Vivemos numa época em que se valoriza demasiadamente a exterioridade, a aparência, o rótulo. É o mundo das marcas, das etiquetas e das grifes para o qual não importa muito a realidade interior de cada ser. Neste contexto, a felicidade e a realização humana passam a estar estreitamente ligadas às coisas exteriores tais como a aparência física, os bens materiais ou o prestígio social.

O exterior das coisas, entretanto, pode disfarçar perfeitamente o conteúdo interior. Um rótulo bem bonito, uma embalagem bem feita e uma propaganda bem elaborada chegam a nos convencer que determinado produto é maravilhoso quando, de fato, não o é. De modo semelhante, na vida pessoal e interpessoal podemos cair em tais enganos. Quem nunca se enganou com certas aparências ou miragens?

Quem permanece somente no mundo das exterioridades vive num palco de ilusões. O “parecer” se torna mais importante do que o “ser”, e a “imagem” mais do que o “eu verdadeiro”. Para ser aceito em determinados meios sociais, procura-se manter a todo custo as aparências. Para não perder o prestígio, prefere-se manter uma falsa imagem de si mesmo.





Viver na exterioridade é viver na superficialidade. Não vale a pena. O ser humano não foi criado para viver assim. Quanto mais exterioridade, mais superficialidade. Que adianta estar todo enfeitado por fora quando lá dentro mora alguém triste e vazio? Que adianta ter prestígio e fama quando o interior não está em paz e harmonia?

As exterioridades não são capazes de dar uma resposta adequada às inquietações do coração humano. Não somos apenas um corpo material. Somos muito mais do que isso. Por esta razão, mesmo vivendo num mundo profundamente materialista, cresce o número de pessoas que buscam orientação em grupos que primam pela interioridade.

Um dos traços mais bonitos da interioridade humana é a “espiritualidade”. O homem não se conforma apenas com o conforto material ou a tranquilidade emocional. Ele sente que foi criado para algo maior. De fato, há no coração humano uma sede que não encontra saciedade a não ser em Deus.

Como podemos cuidar de nossa interioridade? Um dos caminhos mais simples é o da meditação. O ideal é que ela se torne um hábito cotidiano (duas vezes por dia). Basta recolher-se num lugar tranquilo e, em silêncio e quietude, ficar na presença de Deus. Durante vinte a trinta minutos, o meditante permanece repetindo o santo Nome de Jesus, com toda a atenção voltada para ele.






Quando meditamos, saímos da zona dos pensamentos, das reflexões, das análises, dos desejos, das emoções e das expectativas. Queremos, na verdade, sair das estreitezas do eu superficial e deixar que o Pai do céu cuide das camadas mais profundas do nosso ser. Os efeitos da meditação serão percebidos na vida cotidiana.

A meditação nos ajuda a enxergar melhor a nossa própria interioridade. Contemplaremos com alegria a beleza que habita o nosso ser. Perceberemos com maior nitidez aquilo que há de sombrio em nós, e que precisa ser acolhido, pacificado e integrado. Mas, acima de tudo, tomaremos consciência de que bem dentro de nós mora o Espírito de Deus.

A meditação também nos ajuda a valorizar e a respeitar a interioridade de cada pessoa. Não julgaremos mais pelas aparências. Não classificaremos mais pelas exterioridades. As individualidades não serão motivos para contendas ou conflitos, pelo contrário, elas serão admiradas e respeitadas. Cada pessoa será estimada justamente por ser única. Na convivência fraterna a maior aventura será conhecer o outro e deixar-se conhecer por ele. A meditação se torna, portanto, fonte de comunhão entre as pessoas.






Ao cuidar da própria interioridade, o meditante não despreza aquilo que lhe é exterior. A meditação não aprisiona o praticante em si mesmo. Ela o conduz às profundezas do seu ser, mas o devolve mais aberto para Deus e para os seus irmãos. Desta forma, interioridade e exterioridade estarão em harmonia, e já não destoarão uma da outra. Serão como faces de uma mesma moeda.





Paz e bem


Frei Salvio Romero, eremita capuchinho.


terça-feira, 7 de abril de 2015

AS DISTRAÇÕES


Durante a meditação, todos nós desejamos nos concentrar somente no santo Nome de Jesus. Porém, passados alguns instantes de silêncio, percebemos que nossa mente é mais inquieta do que tínhamos pensado. Variados pensamentos e imaginações começam a surgir, afastando-nos do caminho iniciado.

A mente humana foi comparada por um sábio hindu do século IX a uma árvore cheia de macacos que pulam de galho em galho, fazendo uma tremenda confusão de ruídos e movimentos. De fato, sabemos por experiência própria que nossa mente é assim mesmo: inquieta e barulhenta. O meditante vai precisar de muita paciência e tolerância para lidar com esta realidade ao longo de sua vida.

Quando praticamos a oração discursiva (oração com palavras, pensamentos, imaginações ou reflexões), nossa mente fica de certa forma ocupada, e por isso ela não nos incomoda tanto com suas macaquices. Parece estar tranquila e sossegada. Porém, mal começamos a meditar, nossa mente reage violentamente, tornando difícil a nossa concentração.

Não temos como evitar as distrações mentais. Elas são nossas companheiras inseparáveis no caminho da meditação. Certamente os iniciantes sofrem de maneira mais forte a ação delas, porém não temos como afirmar que um dia nos livraremos totalmente delas. O que nos resta a fazer é aprender a conviver com as distrações, considerando-as não como inimigas, mas como oportunidades de treinar a nossa mente, tornando-a mais atenta e concentrada.

Os santos também sentiram grandes dificuldades para aquietar a mente durante a oração. O pai São Francisco, certa vez, destruiu um vaso que fizera porque roubou a sua atenção durante o Ofício Divino (cf. 2Celano 97). Santa Tereza de Ávila comparava as distrações a uma louca que corre sem parar em nossa casa, fazendo bastante barulho.

O que fazer com as distrações? O segredo está em não dar importância a elas. Quanto mais valorizá-las, mais fortes ficarão. Diante das repetidas distrações, conservemos a paz e retornemos sempre ao Santo Nome. Este é um combate no qual se luta com o escudo da paciência e as armas da perseverança e da prática cotidiana.

Os variados pensamentos e imaginações que vão surgindo durante a meditação são parecidos com paisagens que passam rapidamente pela direita e pela esquerda de quem conduz um automóvel por uma longa estrada. Com o olhar voltado para o horizonte, o condutor não se prende àquilo que passa ao seu lado. De forma semelhante, devemos voltar toda a nossa atenção para o santo Nome de Jesus, considerando sem nenhuma importância qualquer outra coisa que possa surgir no caminho.

Durante a meditação não só pensamentos e imaginações afloram em nós, mas também emoções e sentimentos de toda espécie. Mesmo quando surgem pensamentos ou sentimentos agradáveis e santos durante a meditação, nossa atenção não deve ser desviada do Santo Nome. Tudo aquilo que nos tira dele é considerado distração e, portanto, não deve roubar a nossa atenção.

Não devemos nos espantar do efeito contrário, quando queremos nos concentrar a todo custo. Não se alcança bons níveis de concentração com força e violência, mas com uma atenção amorosa e serena. É preciso ter paciência consigo mesmo, perseverar na prática diária e aguardar tempos melhores.  Tudo vai se ajustando. Nossa mente vai ficando mais tranquila e mais focada no Santo Nome de Jesus.

Não julgue como tempo perdido as distrações ocorridas durante a meditação. Mesmo que a concentração seja mínima, você vai experimentar benefícios na sua vida cotidiana. Portanto, não fique lamentando a sua falta de atenção. Saiba que o mais importante é não desistir. Meditar não é simplesmente uma questão de ficar concentrado, é antes de tudo um ato de amor e de fé.



Frei Salvio Romero, eremita capuchinho.