domingo, 9 de novembro de 2014

O momento presente



Você já observou como nossa mente está quase sempre voltada para o passado ou para o futuro? Geralmente, ou estamos recordando o que se passou ou estamos planejando o que estar por vir. Poucas são as vezes que nossa mente repousa com tranquilidade no tempo presente.


Esse vaguear inquieto da mente no passado ou no futuro, principalmente quando acontece de forma intensa e insistente, tira de nós a capacidade de saborear com alegria o momento presente. Dominados por essa mente inquieta, ficamos sempre ausentes daquilo que estamos vivendo e experimentando. Tudo passa a ser vivido de forma muito superficial.


A meditação nos ajuda a descobrir que entre o passado e o futuro há um tempo especial: o tempo presente. Ela faz com que o meditante passe a enxergar melhor a beleza e a singularidade de cada momento de sua vida. Essa percepção, por sua vez, confere mais alegria e serenidade ao coração de quem se entrega a essa modalidade de oração contemplativa.




A invocação do santo Nome de Jesus, quando feita com atenção amorosa, no silêncio e na quietude, vai conduzindo todo o nosso ser a repousar com serenidade no momento presente que é o tempo de Deus. Observe que não se trata de uma técnica complicada. Simplesmente nos desapegamos dos pensamentos, das imaginações e até das emoções. O centro de nossa atenção passa a ser unicamente o santo Nome de Jesus, e nada mais nos interessa durante a meditação.


Gastamos muito tempo de nossas vidas remoendo coisas que já se passaram. Quem permanece preso ao passado vive cheio de saudosismos, de melancolias, de culpas, etc. De fato, encontramos pessoas que sofrem bastante porque vivem colhendo do passado mágoas, ressentimentos, frustrações, remorsos e tristezas. Para essas pessoas se faz urgente e necessário a cura de suas feridas interiores através do perdão, o qual pode ser destinado a elas mesmas ou a outrem. Há também quem sofra bastante porque vive com um eterno saudosismo, não se abrindo às novas experiências e realidades. O tempo da infância ou juventude é considerado como o único tempo bom e ideal.


É impossível retornar ao passado. Só nos resta aceitá-lo do jeito que ele foi. Quando simplesmente o aceitamos, ele perde a tirania que tinha sobre nós. O ideal é que consigamos recordar o nosso passado sem dor ou apegos exagerados. Ter consciência de nossa própria história nos enriquece interiormente, porém nossas memórias não devem nos impedir de continuar alegremente a jornada da vida.


Já quem vive com a mente e o coração voltados de forma exagerada para o futuro passa a ser torturado pelas expectativas e ansiedades, pelos temores e preocupações, ou ainda pelos sonhos que nunca se realizam. Quem vive assim não consegue saborear com alegria e serenidade o tempo presente. Está sempre no mundo do depois. Não se alegra porque vive atormentado pela expectativa ansiosa daquilo que nem aconteceu e nem sabe se vai acontecer.






Como deve ser, portanto, nossa atitude para com o tempo passado? Para o que já passou devemos reservar a palavra “gratidão”. São Paulo diz para nós que “Tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus” (Rm 8,28a). Por isso, devemos ser gratos por tudo aquilo que a vida nos possibilitou experimentar, sabendo que até as realidades mais amargas podem nos ajudar a crescer interiormente.


Já para com o futuro cabe muito bem a palavra “esperança”. Nada de ansiedades e expectativas exageradas. É saudável que tenhamos metas para o nosso futuro e que nos planejemos para alcançá-las. Tudo isso, porém, deve ser feito num clima de esperança, de motivação positiva e de alegria.  Quando o futuro se tornar presente, ele será melhor ou pior, de acordo com as decisões assumidas neste momento atual.






A meditação é um caminho luminoso para quem quer viver com alegria e entusiasmo o momento presente. Não se trata de desprezo pelo nosso passado e nem de irresponsabilidade para com o nosso amanhã. A meditação nos conduz suavemente a enxergar cada instante de nossa vida com uma nova visão. Tudo passa a ter sentido e beleza. De repente, um simples cafezinho ao entardecer, seja na companhia de alguém ou mesmo sozinho, pode se transformar num momento de grande prazer, de intenso aconchego e de uma profunda espiritualidade.





Paz e Bem



Frei Salvio Romero, eremita capuchinho.


segunda-feira, 4 de agosto de 2014


Para que rezar?


 


        
 

Por que sentimos a necessidade de orar? De onde vem esse desejo? Qual o sentido da oração em nossa vida? Partindo de tais perguntas, queremos buscar os fundamentos da oração cristã.


Há no coração humano uma misteriosa “sede de Deus”, um desejo que orienta o homem para o seu Criador. Tem razão o salmista quando canta: “A minha alma tem sede de Deus” (Sl 41/42). Mas de onde vem esta sede? Ela foi colocada em nosso coração pelo próprio Deus que não cessa de nos atrair. De fato, em todos os tempos e culturas o ser humano sempre expressou esse desejo contido nas profundezas de sua alma. O Catecismo da Igreja Católica afirma: “Mesmo depois de ter perdido a semelhança com Deus por seu pecado, o homem continua sendo imagem de Deus. Conserva o desejo daquele que o chama à existência. Todas as religiões testemunham essa procura essencial dos homens” (Cat. 2566).
 

A fé cristã, por outro lado, nos ensina que antes de desejarmos a Deus, ele já nos desejava com amor eterno. A Sagrada Escritura não é em primeiro lugar a história do homem à procura de Deus, mas a história de Deus à procura de sua criatura amada. Ele “nos amou primeiro” (1Jo 4,19) e nos escolhera antes da fundação do mundo (cf. Ef 1,4). Ele tanto nos amou que enviou para nós o seu Filho único (cf. 1Jo 4,9).
 
 
 


Há, portanto, duas sedes: a sede de Deus e a sede do homem. A primeira sede é a causa da segunda. Somente naquela fonte, que desde a eternidade nos deseja, podemos encontrar a água viva capaz de matar a nossa sede. Por isso, Jesus nos faz um convite: “Se alguém tem sede, venha a mim e beba” (Jo 7,37).
 

Quando o homem sedento se deixa encontrar por Deus, começa uma íntima amizade entre ambos. Deus fala e o homem quer ouvi-lo. O homem que ouve atentamente a Deus não fica calado, deseja responder-lhe. E assim, nasce e se estabelece um diálogo entre o Criador e a criatura. Tal diálogo é o que chamamos de oração. Por isso, o Catecismo da Igreja Católica afirma: “A oração, quer saibamos ou não, é o encontro entre a sede de Deus e a nossa. Deus tem sede que nós tenhamos sede dele” (Cat. 2560).
 
 
 
 

Deus nos deseja não como uma coisa ou objeto, mas como um “alguém” que corresponda livremente a esse amor. Por isso, ele nos deu a capacidade de reconhecê-lo, de amá-lo e de obedecê-lo. Desta forma, o ser humano pode escutar a Deus e responder a ele com o coração livre e generoso.
 

Entretanto, sabemos por experiência que nosso amor por Deus é sempre tão frágil, tão pequeno e instável. Enquanto estivermos peregrinando neste mundo, sempre correremos o risco de abandonar a Deus. Precisamos do socorro da graça para amá-lo e permanecer neste amor. Diferentemente do amor divino, o nosso amor precisa ser alimentado a cada instante para que não diminua com o tempo e não venha a extinguir-se.
 

Amizade não cultivada corre o sério risco de extinguir-se com do tempo. Quem não se lembra de um amigo de infância ou de um amigo de escola que ficou lá no passado? Tornaram-se apenas doces lembranças guardadas nas nossas memórias.
 
 
 
 

De forma semelhante, precisamos cuidar de nossa amizade para com Deus para que ela seja sempre atual, viva e fecunda. Faz-se necessário gastar tempo com Ele. É preciso dar-lhe atenção e ficar na sua presença sem nenhuma pressa.
 

A oração é exatamente para isto: para cuidar do nosso amor para com Deus. Quem ora ama mais a Deus e aos irmãos. Quem ora enxerga melhor a ação de Deus na sua vida e ao seu redor. Para quem reza Deus é uma presença sentida e experimentada.

 

Paz e Bem

 

Frei Salvio Romero, eremita capuchinho.

quinta-feira, 1 de maio de 2014


São Francisco

e a Virgem Maria
 
 

Mais uma vez estamos celebrando festivamente o mês dedicado à bem-aventurada Virgem Maria. Enquanto estamos vivenciando as alegrias do Tempo da Páscoa, nosso olhar se volta para a mãe do Ressuscitado para contemplar com ela os mistérios da nossa redenção através da oração do santo Rosário. Por esta razão, queremos, nesta página franciscana, falar um pouco sobre a devoção mariana presente na vida e nos ensinamentos do pai São Francisco.
 
 
 

 
São Francisco contempla a Virgem Maria na sua íntima relação com o mistério da Encarnação, sempre unida ao seu Filho e Redentor: “Onipotente, santíssimo, altíssimo e sumo Deus... por vosso Filho nos criastes, do mesmo modo... o fizeste nascer como verdadeiro Deus e verdadeiro homem da gloriosa sempre Virgem, a beatíssima Santa Maria” (Regra não Bulada 23).
 
 
 
 

Na Carta aos Fiéis, possivelmente tendo em vista a heresia dos cátaros, São Francisco põe em relevo a realidade humana e carnal assumida pelo Verbo eterno de Deus ao se encarnar no seio da Virgem Maria: “Esta Palavra do Pai tão digna, tão santa e gloriosa, o altíssimo Pai a enviou do céu por meio de seu santo anjo Gabriel ao útero da santa e gloriosa Virgem Maria, de cujo útero recebeu a verdadeira carne da nossa humanidade e fragilidade” (Carta aos Fiéis 4).
 
 
 


Tomás de Celano, ao falar da devoção do seráfico pai pela bem-aventurada Virgem, nos oferece a razão deste amor: Francisco “Abraçava a Mãe de Jesus com indizível amor, pelo fato que ela tornou irmão nosso o Senhor da majestade. Cantava-lhe louvores especiais, derramava preces, oferecia afetos tantos e tais que a língua humana não poderia exprimir” (2Celano 198).



 

São Francisco se comovia ao contemplar a pobreza da Virgem Maria e do seu Filho. Celano afirma que num certo dia “Ao sentar-se para o almoço, um irmão lembra-lhe a pobreza da bem-aventurada Virgem e traz à memória a indigência de Cristo, o filho dela. Imediatamente, ele se levanta da mesa, solta soluços dolorosos e, banhado em lágrimas, come o resto do pão sobre a terra nua. Por isso, dizia que esta era uma virtude régia que refulgira de modo eminente no Rei e na Rainha” (2Celano 200,4-6).
 
 
 

 
O santo pai convida-nos não apenas ao louvor e à exaltação da Virgem, mas principalmente a assumir em nossa vida a maternidade da Virgem Maria. Na Carta aos Fiéis ele fala da possibilidade de sermos mães de Jesus: “Somos mães, quando o trazemos em nosso coração e nosso corpo através do amor e da consciência pura e sincera; damo-lo à luz por santa operação que deve brilhar como exemplo para os outros” (2Fi 53).
 
 
 

 
São Francisco nos deixou uma bela e pequenina oração dirigida à Virgem: “Santa Virgem Maria, não há mulher nascida no mundo semelhante a vós. Filha e serva do altíssimo Rei e Pai celestial, mãe de nosso santíssimo Senhor Jesus Cristo, Esposa do Espírito Santo, rogai por nós com São Miguel arcanjo e todas as virtudes do céu e todos os santos, junto a vosso santíssimo e dileto Filho, nosso Senhor e Mestre. Amém” (Antífona do Ofício da Paixão). Nesta oração, o santo exalta a Virgem como a Esposa do Espírito Santo, sendo possivelmente o primeiro a usar esta expressão (cf. Dicionário Franciscano, 2ª edição, Vozes, 1999, pág. 409 e 410).
 
 
 

Por fim não podemos esquecer o amor de São Francisco pela Porciúncula, lugar dedicado a Mãe de Deus, e onde “ele próprio concebeu pelos méritos da Mãe de misericórdia e deu à luz o espírito da verdade evangélica” (Legenda Maior 3,1). Naquele santo lugar ele confiou a sua Ordem aos cuidados da Virgem: “O que mais nos alegra é que ele a constituiu advogada da Ordem e confiou à sua proteção os filhos que haveria de deixar para serem aquecidos e protegidos até ao fim” (2Celano 198,3).

 

 

Paz e Bem

 

Frei Salvio Romero, eremita capuchinho.

sábado, 19 de abril de 2014


São Francisco

e a Cruz do Senhor

 

 
 
A vida de São Francisco foi marcada por vários encontros decisivos com a Cruz do Senhor. Quando foram escritas as primeiras biografias deste santo, poucos anos após sua morte, os escritores registraram diversos episódios reveladores de todo aquele amor especial que São Francisco tinha pelo mistério da Paixão do Senhor. Neste pequeno artigo vamos ressaltar alguns desses episódios para que também nós, motivados pelo santo de Assis, possamos, nesta quaresma, contemplar no mistério da Cruz o grande amor de Deus por  cada um de nós.
 
 
 
 

 
Dois episódios ocorridos no tempo de sua juventude deixaram nele uma grande devoção pela Cruz do Senhor. O primeiro episódio foi aquele ocorrido antes de sua conversão, quando viajava para guerrear na Apúlia e sonhou com um palácio cheios de armas militares as quais, segundo São Boaventura, estariam todas assinalados pelo sinal da santa Cruz (cf. Legenda Maior 1,3). O outro episódio foi a visão que ele teve diante da cruz na capela de São Damião, quando lhe falou o Crucificado: “Francisco, reconstrói a minha casa que está toda destruída” (cf. 2Celano 10).
 
 
 
 

 
 
O amor de São Francisco pela Cruz do Senhor se revela especialmente naquela simples e bela oração que ele nos deixou em seu Testamento: “Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo, aqui e em todas as vossas igrejas que estão no mundo inteiro, e vos bendizemos, porque, pela vossa santa Cruz, remistes o mundo” (Testamento 5). Nos primeiros tempos da Ordem, São Francisco ensinava esta oração juntamente com o pai-nosso para os frades que ainda não conheciam o Ofício Divino, oração litúrgica que os religiosos e os sacerdotes fazem em determinadas horas do dia e da noite (cf. 1Celano 45). Nesta mesma obra, Celano afirma que, quando o santo pai com seus frades entravam nas igrejas, ou quando apenas as viam de longe, recitavam todos juntos esta mesma oração. E Celano acrescenta: “Faziam o mesmo onde quer que vissem uma cruz ou um sinal-da-cruz, seja no chão seja na parede seja nas árvores seja na sebe” (1Celano 45,7).
 
 
 
 
 
 
 
Quem não se comove ao ler aquele episódio tão simples, mas que revela a profunda devoção de São Francisco para com a Paixão do Senhor? “Poucos anos depois de sua conversão, ao caminhar certo dia sozinho por um caminho não muito longe da igreja de Santa Maria da Porciúncula, ia chorando em alta voz e lamentando. E ao caminhar deste modo, encontrou-o um homem espiritual (...). Movido por piedade para com ele, interrogou-o, dizendo: ‘Que tens, irmão?’ Pois julgava que tivesse a dor de uma enfermidade. E ele respondeu: Assim eu deveria ir chorando e lamentando sem vergonha por todo o mundo a Paixão do meu Senhor’. E esse homem começou a chorar e derramar muitas lágrimas juntamente com ele” (Compilação de Assis 78).
 
 
 
 

 
 
E quem não se lembra da sua oração no Monte Alverne antes de receber milagrosamente no seu corpo as cinco chagas do Crucificado? “Ó Senhor meu Jesus Cristo, duas graças te peço que me faças antes que eu morra: a primeira é que em vida eu sinta na alma e no corpo, quanto for possível, aquelas dores que tu, doce Jesus, suportaste na hora da tua acerbíssima paixão; a segunda é que eu sinta no meu coração, quanto for possível, aquele excessivo amor do qual tu, Filho de Deus, estavas inflamado para voluntariamente suportar uma tal paixão por nós pecadores” (III Consideração dos Sagrados Estigmas).
 
 
 
 

 
Tomás de Celano registra numa de suas obras uma visão miraculosa que um dos primeiros frades teve a respeito do santo pai: “Desde o primeiro instante em que começara a servir sob o crucificado, diversos mistérios da cruz resplandeceram em torno dele (...). Frei Silvestre, um de seus primeiros frades, homem de todo consumado pela disciplina, viu sair da boca de Francisco uma cruz dourada que abrangia maravilhosamente, na extensão de seus braços, todo o universo (3Celano 2-3).
 
 
 
 

Finalmente, o amor de São Francisco pelo Senhor crucificado e pela sua santa Cruz teve seu momento mais forte quando, retirado no Monte Alverne, dois anos antes de sua morte, teve a visão do serafim crucificado: “Subitamente, em suas mãos e em seus pés, começaram a aparecer os sinais dos cravos, (...) Também o lado direito parecia atravessado por uma lança, marcado por uma cicatriz vermelha” (3Celano 4).  Assim, o amante da Cruz, recebendo no seu corpo as chagas do Crucificado, tornou-se semelhante Àquele a quem tanto amara.
 
 

Paz e Bem

 

Frei Salvio Romero, eremita capuchinho.


quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014


São Francisco

e o bispo de Assis

 


 

Um dos personagens que aparecem no relato da conversão do jovem Francisco de Assis é o bispo de Assis, conhecido como Guido II. Este nome geralmente é citado de forma tão breve que não nos damos conta de sua importância. Neste pequeno artigo, tanto quanto nos seja possível, queremos oferecer ao leitor um olhar mais detalhado sobre a relação de Francisco com o bispo de sua cidade.  
 
 
 

Nas biografias do santo, o bispo Guido surge no momento crucial do conflito entre o jovem Francisco e seu pai Pedro de Bernardone. Ambos se apresentam diante do bispo para tratar sobre o dinheiro que o pai reivindicava de seu filho. Francisco, desnudando-se diante de todos, devolve tudo o que possuía a seu pai, rompendo definitivamente com ele. Tomás de Celano, descrevendo esta cena, diz a respeito do bispo: “E o bispo, percebendo a coragem e admirando muito o fervor e firmeza dele, levantou-se imediatamente e, acolhendo-o entre seus braços, cobriu-o com o manto com que estava vestido. Compreendeu claramente que era um desígnio divino e reconheceu que as atitudes do homem de Deus que ele vira pessoalmente continha um mistério. Por esta razão, tornou-se em seguida auxílio para ele e, animando-o e confortando-o, abraçou-o com entranhas da caridade” (1Celano 15,3-5).
 
 
 
 

         Quando Francisco e seus primeiros frades foram a Roma para pedir aprovação pontifícia da forma de vida abraçada por eles, encontraram-se com o bispo Guido: “Quando chegaram a Roma e encontraram aí o bispo da cidade de Assis, foram recebidos por ele com imensa alegria, pois venerava o bem-aventurado Francisco e todos os irmãos com especial afeto” (LTC 47,1).
 

O bispo Guido é descrito pelas fontes como aquele que apoiava e aconselhava Francisco e seus companheiros: “E assim eles padeciam penúria extrema. Seus parentes e consanguíneos também os perseguiam; e outros daquela cidade, pequenos e grandes, homens e mulheres, desprezavam-nos e zombavam deles como de insensatos e loucos, exceção feita somente ao bispo da cidade, a quem o bem-aventurado Francisco se dirigia frequentemente para pedir conselho” (AP 17,5). A Legenda dos Três Companheiros diz que Francisco procurava o bispo para pedir-lhe conselhos: “... o bispo da cidade de Assis, a quem o homem de Deus se dirigia frequentemente para pedir conselho” (LTC 35 5).
 
 

O Frei Tomás de Celano também fala da admiração que o bispo Guido nutria pelo santo: “honrava São Francisco e todos os irmãos em tudo e os venerava com especial devoção. (...) Alegrava-se muito por ter tão grandes homens em sua diocese” (1Celano 32,4.6).
 

Parece que não era só São Francisco que procurava o bispo, mas este também o procurava como podemos constatar numa das citações de Celano: “Estando São Francisco a rezar no eremitério da Porciúncula, aconteceu que o bispo de Assis veio visitá-lo familiarmente, como estava acostumado” (2Celano 100,1).
 
 
 
 

 
Na Compilação de Assis, quando São Francisco está falando sobre o respeito e obediência que os frades deveriam ter para com todos os bispos, ele se recorda do bispo de Assis: “Desde o início de minha conversão, quando me separei do mundo e do meu pai carnal, o Senhor pôs sua palavra na boca do bispo de Assis para que me aconselhasse bem no serviço de Cristo e me confortasse” (CA 58,14).
 

Quando São Francisco morreu, o bispo Guido, que estava em peregrinação, teve uma visão sobre o fato ocorrido em Assis. Celano nos conta assim: “Apareceu-lhe por meio de uma visão o bem-aventurado pai Francisco, na noite de seu trânsito, e disse-lhe: ‘Pai, eis que, estou deixando este mundo, vou para Cristo’. Levantando-se de manhã, o bispo narrou aos companheiros o que viu e, tendo chamado o notário, anotou o dia e a hora do trânsito. E, ficando muito triste por causa disto, banhado em lágrimas, lamentava ter perdido um pai especial” (2Celano 220,2-4).
 
 
 

Tendo diante de nossos olhos essas informações, não podemos deixar de, pelo menos, admirar esta figura paternal que esteve próximo a São Francisco. Considerando o que foi exposto até aqui, acho que podemos afirmar que houve entre ambos uma relação de afeto e reverência que perdurou até à morte de São Francisco.
 
 
 
        Paz e Bem
 
 
 
Frei Salvio Romero, eremita capuchinho.