São Francisco
e o bispo de Assis
Um dos
personagens que aparecem no relato da conversão do jovem Francisco de Assis é o
bispo de Assis, conhecido como Guido II. Este nome geralmente é citado de forma
tão breve que não nos damos conta de sua importância. Neste pequeno artigo,
tanto quanto nos seja possível, queremos oferecer ao leitor um olhar mais
detalhado sobre a relação de Francisco com o bispo de sua cidade.
Nas
biografias do santo, o bispo Guido surge no momento crucial do conflito entre o
jovem Francisco e seu pai Pedro de Bernardone. Ambos se apresentam diante do
bispo para tratar sobre o dinheiro que o pai reivindicava de seu filho. Francisco,
desnudando-se diante de todos, devolve tudo o que possuía a seu pai, rompendo
definitivamente com ele. Tomás de Celano, descrevendo esta cena, diz a respeito
do bispo: “E o bispo, percebendo a coragem e admirando muito o fervor e firmeza
dele, levantou-se imediatamente e, acolhendo-o entre seus braços, cobriu-o com
o manto com que estava vestido. Compreendeu claramente que era um desígnio
divino e reconheceu que as atitudes do homem de Deus que ele vira pessoalmente
continha um mistério. Por esta razão, tornou-se em seguida auxílio para ele e,
animando-o e confortando-o, abraçou-o com entranhas da caridade” (1Celano 15,3-5).
Quando Francisco e seus
primeiros frades foram a Roma para pedir aprovação pontifícia da forma de vida
abraçada por eles, encontraram-se com o bispo Guido: “Quando chegaram a Roma e
encontraram aí o bispo da cidade de Assis, foram recebidos por ele com imensa
alegria, pois venerava o bem-aventurado Francisco e todos os irmãos com
especial afeto” (LTC 47,1).
O bispo Guido é descrito pelas fontes como aquele
que apoiava e aconselhava Francisco e seus companheiros: “E assim eles padeciam
penúria extrema. Seus parentes e consanguíneos também os perseguiam; e outros
daquela cidade, pequenos e grandes, homens e mulheres, desprezavam-nos e
zombavam deles como de insensatos e loucos, exceção feita somente ao bispo da
cidade, a quem o bem-aventurado Francisco se dirigia frequentemente para pedir conselho”
(AP 17,5). A Legenda dos Três
Companheiros diz que Francisco procurava o bispo para pedir-lhe conselhos: “...
o bispo da cidade de Assis, a quem o homem de Deus se dirigia frequentemente
para pedir conselho” (LTC 35 5).
O Frei
Tomás de Celano também fala da admiração que o bispo Guido nutria pelo santo:
“honrava São Francisco e todos os irmãos em tudo e os venerava com especial
devoção. (...) Alegrava-se muito por ter tão grandes homens em sua diocese” (1Celano 32,4.6).
Parece que
não era só São Francisco que procurava o bispo, mas este também o procurava
como podemos constatar numa das citações de Celano: “Estando São Francisco a
rezar no eremitério da Porciúncula, aconteceu que o bispo de Assis veio
visitá-lo familiarmente, como estava acostumado” (2Celano 100,1).
Na
Compilação de Assis, quando São Francisco está falando sobre o respeito e
obediência que os frades deveriam ter para com todos os bispos, ele se recorda
do bispo de Assis: “Desde o início de minha conversão, quando me separei do mundo
e do meu pai carnal, o Senhor pôs sua palavra na boca do bispo de Assis para
que me aconselhasse bem no serviço de Cristo e me confortasse” (CA 58,14).
Quando São
Francisco morreu, o bispo Guido, que estava em peregrinação, teve uma visão
sobre o fato ocorrido em Assis. Celano nos conta assim: “Apareceu-lhe por meio
de uma visão o bem-aventurado pai Francisco, na noite de seu trânsito, e
disse-lhe: ‘Pai, eis que, estou deixando este mundo, vou para Cristo’. Levantando-se
de manhã, o bispo narrou aos companheiros o que viu e, tendo chamado o notário,
anotou o dia e a hora do trânsito. E, ficando muito triste por causa disto,
banhado em lágrimas, lamentava ter perdido um pai especial” (2Celano 220,2-4).
Tendo
diante de nossos olhos essas informações, não podemos deixar de, pelo menos,
admirar esta figura paternal que esteve próximo a São Francisco. Considerando o
que foi exposto até aqui, acho que podemos afirmar que houve entre ambos uma
relação de afeto e reverência que perdurou até à morte de São Francisco.
Paz e Bem
Frei Salvio Romero, eremita
capuchinho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário